quarta-feira, 24 de junho de 2009

JORNALISTA FABRICADO PELO NEOLIBERALISMO: ESTAMPA DO IRRACIONALISMO ECONÔMICO

JORNALISTA FABRICADO PELO NEOLIBERALISMO: ESTAMPA DO IRRACIONALISMO ECONÔMICO

João dos Santos Filho

Que desculpem os jornalistas que são contra a obrigatoriedade do diploma profissional, mas vim para somar, com aqueles que entendem ser a regulamentação da profissão de jornalista e a exigência de diploma específico de curso superior de jornalismo instrumentos de fortalecimento sindical. Lutar por uma categoria unida, coesa, mas rica de opiniões diferentes profissionalmente dá credibilidade ao profissional, alimenta e fortalece a liberdade de imprensa contra os interesses de grupos econômicos.
Mas entendo que a discussão vai além do simples embate, entre ser contra ou a favor do diploma de jornalista, o que devemos clarificar é quais os fundamentos teórico-filosóficos que sustenta a idéia irracionalista, que pretende forçar no Brasil por meio da mão do Supremo Tribunal Federal em adotar um processo de desregulamentação de todas as categorias profissionais.
O pressuposto que permite compreender o processo de regulamentação da profissão de jornalista é histórico e produto de lutas pelas liberdades democráticas e de expressão. Localiza-se no interior da luta de classes, espaço no qual estão concentrados os interesses das elites preocupadas em prevenir e até reprimir qualquer projeto político que contribua para ampliação da estabilidade legal da força de trabalho, como é o caso da não obrigatoriedade do diploma para jornalista.
O Estado neoliberal atua na defesa inconteste do movimento de desregulamentação em todos os níveis das atividades de trabalho, como também faz uso da ação privativista, que contribui para o aparecimento de posições contrárias à obrigatoriedade do diploma. O neoliberalismo busca incessantemente destruir, limitar ou impor mudanças cada vez mais restritivas aos princípios legais trabalhistas, exigindo a abertura da economia nacional ao capital multinacional, privatizando as empresas de serviços públicos, cortando gastos, terceirizando serviços, demitindo a força de trabalho, eliminando subsídios e impondo a desregulamentação das relações de trabalho, na qual a não exigência do diploma de jornalista é uma delas.
O discurso irracionalista, caracterizado por utilizar como base o idealismo anticientífico, negando a força cognoscitiva da razão e lançando mão do senso comum. A característica deste discurso despolitizante e alienado é negar a importância do coletivo e privilegiar a individualidade como capaz de mudar a sociedade. Se observarmos com atenção, a prioridade teórica dada para o entendimento dessa sociedade baseia-se no desprezo à racionalidade e no apelo de base existencialista que sedimenta o pensamento neopositivista. Para combater qualquer tentativa que fortaleça o profissional jornalista de formação universitária, para isso, apropria-se da construção gramatical balizada no senso comum e no escracho, que tem suas raízes no campo do neopositivismo. Como podemos perceber no comentário infeliz do presidente do Supremo Tribunal Federal ao se referir na defesa da não obrigatoriedade do diploma de jornalista, comenta:
Um excelente chefe de cozinha poderá ser formado numa faculdade de culinária, o que não legitima estarmos a exigir que toda e qualquer refeição seja feita por profissional registrado mediante diploma de curso superior nessa área. O Poder Público não pode restringir, dessa forma, a liberdade profissional no âmbito da culinária. Disso ninguém tem dúvida, o que não afasta a possibilidade do exercício abusivo e antiético dessa profissão, com riscos eventualmente até a saúde e à vida dos consumidores.


Os neoliberais consideram que os processos reguladores que juridicamente formam o corpo legal do mundo do trabalho são constituídos de instrumentos disciplinadores da força de trabalho e necessitam ser constantemente mudados. Pois devem ser flexibilizados (em favor do Capital) no campo da empregabilidade, pois alegam que as mesmas dificultam que o Capital ganhe agilidade necessária para acelerar o processo de mais-valia. Por isso, entende que toda e qualquer tentativa legal existente devam ser consideradas desnecessárias e ultrapassada para isso utiliza o discurso despolitizante, infantil e re-argumenta sua fala com base na "qualidade total" como resposta imediata assume a postura da ideologia do pragmatismo.
A defesa intransigente pela desregulamentação refere-se à implementação de um Estado que se planifique amparado por um conjunto mínimo e restrito de leis que garantam os direitos de submissão entre Capital e trabalho, o que ocasiona o fim dos direitos sociais garantidos no chamado Estado de Bem-Estar. É o fim das garantias trabalhistas, da estabilidade no emprego e dos ganhos de produtividade da representação sindical no interior das fábricas, como bem argumenta o pesquisador José Paulo Netto, ao se referir ao modelo econômico capitalista neoliberal em que as características:

[...] que está concentrada a essência do arsenal do neoliberalismo: uma argumentação teórica que restaura o mercado como instância mediadora societal elementar e insuperável e uma proposição política que repõe o Estado mínimo como única alternativa e forma para a democracia (PAULO NETTO, 1993: 77).

Os neoliberais argumentam aos brados que outras profissões não são regulamentadas e o profissional está inserido no mercado por sua competência, portanto não há necessidade de nenhuma formatação jurídica (por isso nega a necessidade do diploma), mas, sim, de pessoal qualificado capaz de garantir seu mercado de trabalho.
Há ainda os mais obedientes aos ensinamentos do neoliberalismo, aqueles que afirmam que a regulamentação da profissão limitaria o nosso campo de trabalho, deixando de lado atividades que poderão surgir e que necessariamente fugirão a nossa amplitude regulamentada. Conclusão sem nexo lógico e simplesmente força de uma construção gramatical de base no senso comum.
Enquanto essas questões vão ocorrendo, as lutas sindicais vão sendo retardadas; os profissionais fortalecem a visão equivocada de que conteúdo pedagógico e política são questões que devem ser tratadas separadamente e fora do âmbito das salas de aula. Essa cultura de separação entre o acadêmico e o político, foi sendo reforçada durante os vinte e cinco anos de Ditadura Militar. Amigos morreram por pensar diferente. Jornalistas foram caçados, exilados, torturados e mortos, pois sempre lutaram pela liberdade de poder aprofundar o senso crítico dos alunos, contra a Ditadura, a opressão e pela eterna liberdade de pensamento.
Por isso, jornalista, não se deixe levar pelas falas sedutoras daqueles que se dizem nossos amigos, mas, na verdade, lutam para que o jornalismo não amplie seu mercado de trabalho e não se reconheça como elemento transformador da realidade. Lutam para que nossa categoria não cresça e, sim, desapareça, pois na lógica dessas pessoas todos podem vir a contribuir, não necessitando de nenhum estatuto corporativo.
Diploma não é sinônimo de competência, mas sim de segurança para a sociedade que deve garantir a liberdade de expressão dentro de um código de ética pensado pela categoria diplomada e não pelas empresas jornalísticas. Portanto lutar pelo respeito ao piso salarial, contra a terceirização de nossa função e a pressão ideológica de grupos econômicos é declarar luta ao neoliberalismo, que deseja fabricar o “novo” jornalista informante e não formador de opinião.

BIBLIOGRAFIA


PAULO NETTO, José. Crise do socialismo e ofensiva neoliberal. São Paulo: Cortez, 1993.

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