domingo, 21 de junho de 2009

O Turismo na era Vargas e o Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP

O Turismo na era Vargas e o Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP


João dos Santos Filho
UEM - Universidade Estadual de Maringá




Resumo
O objetivo deste estudo é compreender como a ditadura getulista incorpora e trabalha a questão do turismo no “Estado Novo” e recuperar a verdadeira historiografia do turismo nacional. Nesse palco aparecem figuras como Alzira Vargas filha e auxiliar de gabinete do Presidente da República, o ator Procópio Ferreira e o prefeito da cidade de Poços de Caldas, Francisco de Assis Figueiredo armando estratégias para que o turismo se torne Política de Estado. Noutro, o picadeiro dos órgãos de segurança, o Departamento de Propaganda - DP coordenado por Lourival Fontes e - Serviço de Inquéritos Políticos e Sociais – SIPS coordenado por Filinto Strubing Müller, que se unem e adotam o turismo como mais uma forma de controle ideológico do Estado.
Palavras – chave: turismo; órgãos de repressão; carnaval; cassino; ideologia.





Resumen
El objetivo de este estudio es comprender como la dictadura getulista incorpora y trabaja la cuestión del turismo en el “Estado Nuevo” y recupera la verdadera historiografía del turismo nacional. En ese escenario surgen figuras como Alzira Vargas hija y asistente de gabinete del Presidente de la República, el actor Procópio Ferreira y el alcalde de la ciudad de Poços de Caldas, Francisco de Assis Figueiredo arreglando estrategias para que el turismo se vuelva en Política de Estado. En otro, el picadero de los órganos de seguridad, el Departamento de Propaganda - DP coordinado por Lourival Fontes y - Servicios de Averiguaciones Políticos y Sociales – SIPS coordinado por Filinto Strubing Müller, que se unen y adoptan el turismo como más una forma de control ideológico del Estado.
Palabras - clave: turismo; órganos de represión; carnaval; casino; ideología.






INTRODUÇÃO



O aparelho de Estado decorrente de um processo de ditadura militar fascista impõe à sociedade uma forma autoritária de ver o mundo, exigindo que os interesses do Capital sejam preservados, apesar de sua crise inerente de adaptação e readaptação na busca incessante de acumulação da mais-valia. Sim, o Capital se revigora e se mantêm no processo dialético de sua globalização imperialista histórica, configurando-se em vários e diferentes processos fundidos numa crise da sociedade contemporânea que persiste e é explicitada pelo mundo do trabalho.
As crises são pontuais e ocorrem explicitadas por meio de golpes de Estado, que muitas vezes levam às verdadeiras tragédias que passam a ser comédia, mas sempre, engrossando de forma plena os populismos fascistas e ou de tonalidade liberal positivista. E neste caso, o governo de Getúlio Vargas assim se encaixa, trazendo para o país avanços em todos os campos de desenvolvimento, à custa da censura, autoritarismo nacionalista, repressão, tortura e exílio.
Com isso, afirmamos que a Ditadura getulista necessitava criar um instrumento que firmasse uma determinada ideologia capaz de garantir ao Estado, apoio político e lhe desse poder de persuasão dentro das classes populares, pois;

A ideologia do sistema social estabelecido se afirma violentamente em todos os níveis, do mais grosseiro ao mais refinado. De fato, os vários níveis do discurso ideológico se intercomunicam de várias maneiras. Podemos recordar neste contexto que alguns dos mais célebres intelectuais do pós-guerra declararam em seus livros e estudos acadêmicos que a distinção “antiquada” entre esquerda e direita políticas não fazia sentido nenhum em nossas sociedades “avançadas”. Sabe-se muito bem que essa idéia tem sido avidamente acolhida pelos manipuladores da opinião pública e amplamente difundida com o auxílio de nossas instituições culturais, a serviço de determinados interesses e valores ideológicos. Graças a tal comunicação entre o “sofisticado” e o “vulgar”, tornou-se comum chamar os representantes da direita de “moderados”, enquanto aqueles da esquerda eram designados como “extremistas”, “fanáticos”, “dogmáticos” e coisas similares.


O Estado Getulista necessita após a implantação da ditadura, dizer para que e por que dominou o aparelho de Estado e escolher quem serão seus interlocutores principais. Para isso, cria em 1939 o Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP, como instrumento capaz de centralizar e direcionar a ideologia do “Estado Novo” junto à população em geral e aos trabalhadores em particular.
E graças à atuação “insolente” de bastidor e própria da juventude da época a filha de Getúlio, Alzira Vargas consegue impor a criação da Divisão de Turismo como uma preocupação do “Estado Novo”, cujo objetivo seria:

[...] organizar e fiscalizar os serviços turísticos internos e externos [...] De acordo com o regimento do DIP, a divisão deveria organizar planos de propaganda no exterior e executá-los, organizar fichários e cadastro de informações turísticas, corresponder-se com outras organizações no plano internacional, organizar e divulgar material de propaganda turística sobre o país.





COMO SURGIU A IDÉIA PELO TURISMO



A idéia pelo turismo como uma atividade economicamente promissora para o governo nasceu por insistência de Alzira Vargas junto a seu pai. Tudo começou no dia 5 de fevereiro de 1938 em que: “Pela manhã, seguiram para Poços de Caldas a Darci [esposa de Getúlio] e a Alzira” (VARGAS. Diário, 1995, p. 105) embarcando em um Lockheed-Loadstar aeronave moderna e luxuosa na época, com dois pilotos e dois motores, café como serviço de bordo e radio regalias só permitidas para viagens do presidente da República.
Segundo Alzira, “Papai era esperado em Poços de Caldas para um pequeno descanso em fins de março. Enquanto ele não chegava, enchia meu tempo como podia” (PEIXOTO. Getúlio Vargas, meu pai. 358 e 359). Com 24 anos de idade e na verdade a primeiras férias longa em família, Alzira preenche seu tempo, com passeios a cavalo, bicicleta, festas noturnas e bailes na cidade de Poços de Caldas. Como filha do presidente e conhecida, acabava sendo objeto de curiosidade das pessoas e por sua personalidade falante e extrovertida era fácil de fazer amigos e deixa registrada suas peripécias na cidade, na biografia que escreve sobre seu pai afirma que participou de atividades não muito convencionais, ainda mais para filha do Presidente da República:

Houve corridas de charrete, como se fossem bigas romanas em torno da praça principal; cavalgadas noturnas à volta do hotel, despertando os hóspedes que já se haviam recolhido. Atravessávamos a rua cantando a plenos pulmões serenatas para nós mesmos. Fomos expulsos do cinema porque, ao invés de olhar o filme, perturbávamos (sic) os pacatos freqüentadores da segunda sessão, comentando em voz alta os fatos do dia. [...] Terminei minhas façanhas entrando, às escondidas de mamãe, que estava sempre perto de nós, em um avião de acrobacias pilotado por um habilíssimo piloto alemão.


Alzira sabia que, depois dessas ousadias e a farra que seu bloco carnavalesco havia feito pela cidade em pleno carnaval, sua mãe faria restrições a certos comportamentos e poria uma série de regras, além do que, seu pai logo chegaria e suas férias iriam ser interronpidas.
O prefeito de Poços de Caldas, Francisco de Assis Figueiredo apresentava certo sinal de impaciência com os veranistas que perturbavam o sossego dos hóspedes do Palace Hotel na qual Alzira e seu irmão Getúlio faziam parte. Nesse momento, o prefeito os convida para ir a seu gabinete para conversar, veio à bronca do chefe do executivo municipal para a filha do Presidente da República. “Começou com um apelo veemente para que fizéssemos menos barulho. Rimos de maneira diplomática que encontrara para restabelecer a calma de sua cidade [...]”.
Depois da teatral bronca, veio o verdadeiro motivo do convite para ir ao gabinete do prefeito:

Mostraram-me mapas, folhetos, relatórios, estatísticas, estudos para me provar que o Brasil estava perdendo uma fonte de renda excepcional, por falta de organização turística. Pediram-me que sugerisse ao Patrão, com a máxima urgência, a criação de um organismo que se dedicasse à propaganda de nossas belezas naturais, e fomentasse a vinda de turistas estrangeiros a nosso País.

Nesta reunião estava presente o ator Procópio Ferreira, que fez várias intervenções pleiteando a construção de novos teatros, para acelerar e ampliar o meio artístico e cultural do país. E junto com a fala do prefeito, Procópio ratificava:

Isso sem levar em conta o que cada turista gasta ‘per capita’, em alimentação, roupas, lembranças, presentes. É dinheiro em circulação que fica no país. Estamos perdendo uma inestimável fonte de renda.


O prefeito de Poços entendia que o turismo poderia ser incentivado, e sua cidade havia conquistado o titulo de melhor estância hidromineral da América Latina, e em março de 1931 é inaugurado o complexo hoteleiro, cassino e casa de espetáculos; Palace Casino, Palace Hotel e Thermas Antônio Carlos. Reduto de apresentação de diversos artistas na cidade, dos quais podemos destacar Carmem Miranda, Aurora Miranda, Grande Otelo, Oscarito, Procópio Ferreira, Orlando Silva, Carlos Galhardo, Silvio Caldas, Ermeto Zaconi, Companhia Gatini Angelini, Ary Barroso, a cantora e atriz argentina Libertad Lamarque.
A cidade de Poços de Caldas conseguiu se converter em pólo de entretenimento para uma nascente burguesia e conseqüentemente a ditar moda. Local próprio para que o charme e glamour da elite pudessem exibir roupas exóticas que não poderiam ser livremente apresentadas nos grandes centros, por isso, os teatros, salões dos cassinos e as tradicionais praças passam a ser locais em que o desfile de moda e o conhecido footing tornaram essa cidade a preferida da burguesia nacional e internacional.
Com uma infra-estrutura preparada para o jogo e para shows artísticos e musicais Poços de Caldas até o fechamento dos cassinos em 1946, possuía vinte quatro casas de jogos desde as mais simples até aquelas de alta sofisticação. Em que, músicos a classe artística e toda uma equipe de apoio logístico davam a vida noturna da cidade um requinte de bele époque.
É inaugurado o primeiro Parque Municipal, hoje o atual Country Club., pensando em dar “distrações aos turistas” e a possibilidade de organizar caçadas na região (atividade que não tinha ainda a percepção da questão ecológica- ambiental). Formar guias de turismo, melhoras as vias de transporte, essas eram em síntese os argumentos do prefeito na defesa do turismo.



REAÇÃO DE GETÚLIO PARA COM O TURISMO

Diante de tantos argumentos convincentes por parte do prefeito e do ator Procópio Ferreira, Alzira não teve como recusar e afirma que defenderá a idéia junto a seu pai, que chegou a cidade de Poços de Caldas no dia 26 de março, e em seu livro afirma que:

Prometi ajudá-los e assim que Papai chegou expus-lhe a idéia. Não demonstrou muito entusiasmo, assuntos muito mais importantes e prementes ocupavam seu pensamento.

Alzira que, mais do que ninguém conhecia seu pai, percebeu que outros assuntos ocupavam seu pensar, mas não poderia imaginar que sua filha Celina Vargas (neta de Getúlio) no ano de 1995 ajudasse esclarecer que a questão era amorosa, como esta registrada com a publicação do Diário de Getúlio Vargas. O Presidente em seu diário relata que entre o dia 26 e 27 de março, acabando de chegar a Poços de Caldas para reencontrar com a família declara estar:

Mas estou inquieto e perturbado com a presença daquela que me despertou um sentimento mais forte do que eu poderia esperar. O local a vigilância, as tentações que a rodeiam e assediam não permitem falar-lhe, esclarecer situações equívocas e perturbadoras. Amanhã, talvez, um passo arriscado ou uma decepção. O caminho se bifurca – posso ser forçado a uma atitude inconveniente.


Percebemos que, o senhor Presidente estava perturbado em razão de uma mulher que já se encontrava na cidade e transitava nos escalões da elite local. Se vê envolvido por uma paixão explosiva que o leva no dia 30 de março a realizar uma aventura ardente para ir ao encontro de sua amada, o Diário revela que nessa data Getúlio:

Levanto-me cedo e vou ao rendez-vous previamente combinado. O Encontro deu-se em plena floresta, à margem de uma estrada. Para que um homem de minha idade e da minha posição corresse esse risco, seria preciso que um sentimento muito forte o impelisse. E assim aconteceu. Tudo correu bem. Regressei feliz e satisfeito, sentindo que ela valia esse risco e até maiores.



O ESTADO NOVO E O TURISMO



Por isso, Getúlio ao ser consultado sobre o turismo como fonte de renda, demonstra certa indiferença, pois está perturbado pela presença de sua amada na cidade, na qual imediatamente sua filha sugere:

Quem sabe se juntando o SIPS do Filinto para a organização no interior e o DIP do Lourival para a propaganda, se possa começar alguma coisa nesse setor, ainda que modestamente?


E assim, em 1938 nasce à preocupação do governo Federal para com o turismo no Brasil, seria cômico se não fosse trágico, mas o mesmo foi pensado junto ao SIPS - Serviço de Inquéritos Políticos e Sociais encarregado da coordenação de elementos informativos de interesse da polícia Preventiva. Atividades exclusivamente de controle ideológico em que a espionagem, a polícia secreta, a repressão a qualquer outro discurso que não fosse à ideologia do Estado Novo, formatava as atividades desse órgão de informação e segurança nacional.
O Departamento de Propaganda - DP coordenado por Lourival Fontes teve como uma de suas principais atividades a promoção do Brasil no exterior, com a edição de uma diversificada folhetaria e criação de boletins informativos sobre o Brasil em vários idiomas e distribuído em hotéis, consulados, embaixadas, navios, órgãos públicos no exterior. Provavelmente Alzira ao sugerir que o SIPS e o DP acolhem-se o turismo se deve ao fato desses órgãos serem os mais importantes para o “Estado Novo” e por onde passava toda a política nacional do presidente Getúlio Vargas. Como nos confirma Elizabeth Cancelli:

A ligação da polícia com Vargas foi crucial para um Estado delineado com as características dos 15 anos de governo Vargas. E as relações do ditador com o poder policial eram complexas. Na realidade, as insinuações de que Vargas controlava a polícia de uma forma autônoma e paralela à lei eram completamente dispensáveis, porque não passavam da mais pura realidade. Com braço executivo do regime, a polícia aparece claramente em toda a estratégia de ação e de domínio. Assim, o tom de denúncia em que se baseavam sugestões de que o chefe de polícia teria um poder exagerado era muito mais o testemunho de perplexidade com que segmentos da população viam a ação da polícia e do Estado: centralizadores nos atos e totalitários na ideologia.

O turismo foi entendido por Alzira como algo capaz de divulgar o Brasil e levar a imagem de seu pai para o exterior. Por isso, ela só poderia pensar no turismo apensado aos órgãos policiais, pois estes é que sustentavam o Estado Novo e davam a “legitimidade” ditatorial para um populismo que acabava questionando a dominação norte-americana no território nacional e dando uma liberdade previamente delimitada ás classes trabalhadoras pelo governo.
Assim a preocupação pelo turismo vai aparecer em dezembro de 1939, quando foi definitivamente criado o Departamento de Imprensa e Propaganda - DIP que era uma fusão entre o SIPS e o setor de propaganda, na qual em sua estrutura aparece uma Divisão de Turismo.
O turismo surge assentado aos interesses políticos e ideológicos do Estado getulista, isto é, se constitui também em um instrumento preocupado em garantir a uniformidade, monopólio e o tom permissível das mensagens produzidas pelos veículos de informação tanto a nível nacional como internacional.
O turismo também esta a serviço do Estado com o objetivo de aglutinar forças para a inculcação da imagem populista de Getúlio, garantindo que a contra propaganda ficasse retida nas mãos dos censores. O caminho estava aberto para que o governo getulista apoiado pelos meios de comunicação de massa determinasse que tipo de noticia pudesse ser divulgado no território nacional e internacional.
Não podemos esquecer que, desde 1930 o governo de Getúlio desenvolve uma estrutura burocrata para aparelhar o Estado comandado pelo médico Batista Luzardo, que realizou uma verdadeira assepsia nos órgãos policiais, exonerando delegados e nomeando outros que atendiam aos interesses do novo governo, segundo a historiadora Elizabeth Cancelli:

Não seria por acaso que, em março de 1931, Luzardo tornaria pública a contratação de dois técnicos do Departamento de Polícia de Nova Iorque, para que fosse organizado no Brasil o serviço especial de repressão ao comunismo.


A colaboração dos Estados Unidos no combate ao comunismo vai continuar em anos posteriores, e conta com a simpatia da população civil e o endosso dos meios militares que articulam o discurso em defesa do cristianismo do povo brasileiro contra o comunismo. Essa será a tônica persistente que tentará justificar o porquê das ditaduras de 1930 e 1964 quebram o Estado democrático: Salvar a pátria do regime comunista.
Por isso, o Estado vem se organizando militarmente e policialmente para combater o inimigo interno e externo que é o partido comunista brasileiro e o perigo vermelho de Moscou. É nesse cenário que aparece o poderoso DIP cuja uma de suas funções era fortalecer:

A imagem pública de Vargas se fortaleceu e a necessidade de um poder firme e forte para reprimir o comunismo ganhou peso tanto nos meios militares como civis. Em 3 de dezembro, o ministro João Gomes reuniu no Rio de Janeiro todos os generais que serviam na capital para propor ao governo uma legislação mais rígida e a imediata expulsão do Exército dos militares envolvidos na revolta comunista.


Mais adiante, o historiador Brandi, revela, mais um fato que merece ser registrado:

Em 10 de janeiro de 1936, o ministro Vicente Rao anunciou a formação da Comissão Nacional de Repressão ao Comunismo, encarregada de investigar de forma sumária atos ou crimes contra as instituições políticas e sociais e dotada de poderes para requisitar prisões diretamente ao chefe de polícia em casos de urgência.


O DIP congrega na sua Divisão de Turismo uma das atividades consideradas mais importantes para a construção da imagem de uma “ditadura fascista democrática”, por isso o Estado investe no desenvolvimento da atividade turística em diferentes frentes com o objetivo de combater o comunismo e sedimentar a imagem do presidente da República como democrata e pai dos pobres.
Os Eventos comemorativos organizados pelo governo podem vir a ser considerado como uma atividade ligada ao turismo e utilizada pelo Estado Getulista para fortalecer a imagem do presidente perante a sociedade brasileira e criar um sentimento de paternidade com a classe trabalhadora por meio dos grandes comemorações organizadas pelo DIP, como descrito na Revista Cultura Política:

12-10-42 – Instalação solene da “Semana da Criança, promovida pelo “Departamento Nacional da Criança” (Revista Cultura e Sociedade, ano II n. 21, ano 1942, p.401).

1 a 5 de setembro [1943] – promoveu uma concentração dos escolares premiados na “Campanha da Borracha Usada”, no Campo do Botafogo Foot-Ball Clube e na Quinta da Boa Vista, sendo distribuídas, nessas ocasiões, por funcionárias do D. I. P., 4.850 merendas aos escolares referidos;
10 de novembro – foram organizadas 14 retretas em vários logradouros públicos, com a cooperação de bandas de música militares; no campo do Fluminense F. C., realizou-se um concerto sinfônico, que obteve o melhor êxito, com a colaboração da “Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal”, sob a regência do maestro José Siqueira; no Museu Nacional de Belas Artes, uma exposição de pintura, e mais uma exposição do livro “Brasil pela imagem”, de Álvaro Marins (Seth).
25 de janeiro [1944] – festas comemorativas do aniversário da fundação de São Paulo, com a colaboração da Orquestra Sinfônica Brasileira;
16 de abril – festa infantil, na Quinta da Boa Vista, em comemoração do aniversário do Presidente Vargas, com a colaboração das bandas de música militares;
17 de abril – espetáculo ao ar livre, no estádio do Botafogo F. C., pelo mesmo motivo;
19 de abril – 7 retretas em logradouros públicos, com distribuição de livros às crianças dos asilos e Casa dos Expostos, e de entradas para circos e casas de diversões às crianças pobres;
19 de junho – filmagem completa da festa dos pescadores em Paquetá;
22 de agosto – missa campal no Russel, em comemoração à entrada do Brasil na guerra, havendo á noite, concerto sinfônico no estádio do Fluminense F. C.;
4 de setembro – festa infantil, em comemoração da “Semana da Pátria”, fornecendo o D. I. P. condução, merenda e divertimentos às crianças, na Quinta da Boa Vista;
15 de outubro – festa infantil, no teatro Carlos Gomes, em comemoração da “Semana da Criança”.


Na verdade, essas atividades vão ser constantes e massivas em todo território nacional durante o período Vargas, na Capital Federal com a participação direta do presidente e nos Estados com a presença dos interventores. Despertando o sentimento de nacionalidade e afastando a idéia de uma possível divisão territorial, pois a unidade nacional era o pressuposto básico que daria ao presidente plenos poderes para governar.
O DIP se solidifica e diversifica suas atividades ideológicas colocando sempre como prioritário a imagem do governo revolucionário como co-participante em datas dos heróis nacionais, como Tiradentes, apoio ao dia Pan-americano, expulsão dos holandeses do Brasil, Congresso de Brasilidade, Dia da Raça.
Segundo a Revista Cultura e Política de novembro de 1942, podemos perceber que o turismo ascende com uma força ideológica doutrinaria na qual o DIP dava uma importância privilegiada, vejamos:

[...] iniciou a filmagem de shorts destinados à propaganda turística do Brasil no exterior.
O mesmo pode dizer-se da Secção de Turismo, que se incumbia de receber e assistir os visitantes estrangeiros, facilitando-lhes o acesso por meio de vistosos cartazes e folhetos com informações detalhadas sobre os pontos mais atraentes do país, fazia a propaganda externa, com o propósito de melhor atraí-los à nossa terra.



Contribuindo para esse esclarecimento histórico, e demonstrando mais uma vez, a importância do turismo como mais um instrumento capaz de ajudar a cristalizar a ideologia do Estado Novo. Goulart afirma que:

Segundo Alzira Vargas do A. Peixoto, o incremento do turismo havia sido uma das razões da criação do DIP. Ela relata o empenho de autoridades administrativas, em 1938, no sentido de convencê-la sobre a necessidade de se organizar o turismo nacional, o que resultaria em fonte de renda excepcional para o país. Com a cobrança de pequena taxa sobre o turismo seria possível aperfeiçoar os serviços de hotéis, organizar viagens, formar uma equipe de profissionais especializados e melhorar as estradas.


Entendemos que a atividade turística é um elemento importante para economia, pois sua capacidade de agregar valor é imensa, como também, o Estado getulista criou a Divisão de Turismo junto ao DIP, por questões de estratégicas. Pois, sabia que o turismo poderia ser usado pelo Estado como forma de solidificar a imagem da ideologia do Estado Novo. Nesse sentido, estamos afirmando que o turismo serviu aos interesses do governo de Getúlio, desde os eventos organizados nos estádios de futebol, praças públicas, escolas, produção de literatura para divulgar o Brasil no exterior e embelezamento do Rio de Janeiro com a inauguração do Cristo Redentor no Corcovado, até os convites oficiais para que atrizes estrangeiras viessem passar o carnaval no Rio.
A dimensão da atividade de turismo era tão importante para o DIP, que segundo relatos encontrados nos seus informes publicados por ele na Revista Cultura e Política, justifica de forma contundente uma declaração de uso e fruto do turismo pelo Estado:

Modernamente, o turismo é um dos grandes recursos de que os povos lançam mão para melhor desenvolvimento do intercâmbio econômico, cultural e até político sendo de fato modelares as organizações especializadas de certos países, com um proveito próprio, seguro e evidente.
Os técnicos utilizam-se de todos os motivos de beleza e de sedução, dos aspectos naturais e da criação do gênio Humano para atrair o forasteiro, tornando a permanência nos sítios amenos e aprazíveis o mais agradável possível com a cumulação de todos os requisitos de conforto.



Podemos destacar três circunstancias em que o turismo foi sentido e incorporado pelo governo na formatação do Estado Novo. O primeiro é aquele que aqui já nos referimos, usou o turismo como forma de controle social, pois percebeu seu beneficio na formatação da imagem do Estado Novo. O segundo é que considera o turismo coma uma fonte de renda, sendo que o Rio de janeiro já figurava em cartazes do mundo todo como um pólo turístico a ser visitado como paraíso tropical. E terceiro aquele em que o turismo pode vir a ser um importante instrumento para o desenvolvimento interno econômico, social e político.
O primeiro transformou todo o evento cívico e militar em atividades que eram organizadas pelo DIP por meio da Divisão de Turismo, controlava o conteúdo de folhetos de divulgação do país a nível interno e externo, recebia técnicos e profissionais do mundo da comunicação internacional. O objetivo dessa divisão é ajudar o Estado no controle das informações que poderiam ser difundidas internamente e internacionalmente sobre o Brasil.
Nesse sentido, o turismo tem um papel extremamente revelador para os países que estavam sob ditadura militar, ele é utilizado pelo Estado como forma de controle ideológico, adquirindo um poder policialesco das estruturas burocráticas preparadas para manter a ordem e firmar diante a opinião pública a imagem do presidente. Em uma das publicações da Revista Cultura Política aparece uma série de atividades que deverão ser continuas e desenvolvidas pelo DIP – DT:

- promover conferências, com ilustrações aqui e nos Estados acerca da atualidade nacional e das perspectivas de novas atividades;
- provocar a visita de personalidades estrangeiras de relêvo, (sic) indicando-lhes tudo quanto nos interessa conhecer por seu intermédio. Explicar-lhes a significação da nossa evolução histórica, afim de que possam compreender os laços que prendem a atualidade ao passado e ao futuro do Brasil;
- promover contactos entre os centros nacionais de cultura, mediante visitas recíprocas;
- distribuir cartazes, cartões postais, folhetos e pequenos livros, acerca do Brasil, nas estradas de ferro internacionais, nos centros de cultura, nos hotéis, bibliotecas, lugares públicos idôneos das cidades americanas (do Sul, do Norte e do Centro);
- promover a construção de hotéis, em lugares pitorescos (praias, montanhas, estações de águas, etc.) mediante favores legais concedidos às iniciativas particulares, que queiram seguir os planos aprovados pelo governo nesse sentido;
- estimular a visita de jornalistas, escritores, políticos e personalidades de destaque, nos outros países, que demonstrem desejo de conhecer o Brasil e possam inferir no desenvolvimento das suas relações externas;
- manter um serviço permanente de intercâmbio espiritual e cultural entre os Estados e o Rio de Janeiro;
- provocar aproximação mais intima com os serviços de cooperação intelectual, do Ministério do Exterior, a fim de poder participar dos seus programas desde já e, futuramente, intervindo no intercâmbio cultural em harmonia com os referidos programas daqueles antigos e ótimos serviços;
- provocar aproximação mais íntima com o Serviço Nacional de Teatro, afim de agir em harmonia com o mesmo na expansão cultural que constitue seu programa;
- manter serviços de coordenação cotidiana e cordial com as outras direções do D. I. P., delas obtendo apoio, afim de que os outros assuntos relativos ás expectativas do turismo atual, próximo e futuro, possam ser completadas a tempo;
- provocar idêntica cooperação dos serviços de turismo da Prefeitura do Distrito Federal, assim como dos das demais Municipalidades brasileiras;
- instituir serviços permanentes de informações sobre a atualidade nacional, dos pontos de vista materiais, intelectuais e culturais, afim de que compreendam os objetivos em que se inspiram todos os órgãos do Governo. Essas informações, traduzidas em inglês, francês e espanhol, terão distribuição espontânea ou solicitada, conforme circunstâncias.


Na verdade o governo se dá conta que as atividades turísticas são amplas e podem agregar valor de forma rápida e constante facilitando um amplo processo de empregabilidade para a economia e se constitui ainda, em um instrumento fundamental para cristalizar a imagem do Estado Novo. E percebe que o Estado começa a sentir que há necessidade da elaboração de um programa nacional de turismo, como expresso:

Como um programa de turismo deve envolver tôdas as companhias de transportes (ferroviários, marítimos e aéreos), com elas manter-se-ão métodos permanentes de propaganda, mediante reciprocidade, por exemplo, e, também, contactos permanentes com os serviços análogos de outros países.
[...]
O ano de 1945, portanto, será para a D. T. um ano de grandes atividades, com a reorganização completa dos seus serviços, traçados de modo a aparelhá-la para a retomada do turismo que, dos vários países, se encaminharão para o Brasil.

O Estado Getulista entende a força econômica e política do turismo, e começa a usá-lo como um instrumento que deve ser administrado pelo Estado e, portanto, exige uma proposta configurada em um Plano Nacional de Turismo. Essa idéia começa a criar corpo na seqüência dos outros governos; com Juscelino Kubitschek a lógica do turismo aparece com a inauguração da Capital Federal criando a Companhia Nacional de Turismo – Combratur em 19 de abril de 1960 um dia antes da fundação de Brasília; com Jânio da Silva Quadros o curto e conturbado período de governo, o turismo é esquecido; com João Goulart o turismo é colocado no Ministério da Indústria e Comércio, com a criação da Divisão de Turismo e Certames em 29 de dezembro de 1961; em 1964 o golpe militar cria a EMBRATUR.
Na verdade, 1964 colocam o turismo como instrumento de apoio para acobertar as atividades de repressão, tortura e assassinato cometidas pelo aparelho de Estado, entretanto, este é objeto de um novo artigo e merece uma série de outras ponderações.


BIBLIOGRAFIA

BRANDI, Paulo. Vargas da vida para a história. Rio de Janeiro: Zahar, 1983;
CANCELLI, Elizabeth. O mundo da violência: a polícia da era Vargas. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1993;
Cultura Política. Revista Mensal de Estudos Brasileiros. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP. Ano IV n. 47, dezembro de 1944;
Cultura Política. Revista Mensal de Estudos Brasileiros. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP. Ano II, n. 21, 10 de novembro de 1942.
Getúlio Vargas: Diário / apresentação de Celina Vargas do Amaral Peixoto; edição de Leda Soares. São Paulo: Siciliano; Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1995;
GOULART, Silvana. Sob a verdade oficial: Ideologia, propaganda e censura no Estado Novo. São Paulo: Marco Zero, 1990;
MÉSZÁROS, István. O poder da ideologia. São Paulo: Ensaio, 1996;
PEIXOTO, Alzira Vargas do Amaral. Getúlio Vargas, meu pai. Porto Alegre: Globo, 1960;

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